
Acordar antes do sol, enfrentar o frio da madrugada, lidar com máquinas, animais e incertezas econômicas. Esta é a realidade de Jairo Pastório, agricultor do Pontão dos Manecos, interior de Espumoso. Aos 47 anos, ele segue firme na lida com a produção leiteira, um dos setores mais exigentes da agricultura familiar. “Acordo todo dia por volta das 4h30. Tem que tirar o leite, lavar tudo, cuidar das vacas... e não tem sábado, domingo ou feriado. É todo dia”, descreve.
A rotina que ele compartilha com o pai, seu Tonico, de 78 anos, é marcada por esforço contínuo, mas também por um vínculo profundo com a terra. “A gente nasceu aqui. Meu pai já fazia isso e eu segui. É o que eu sei fazer, o que eu gosto de fazer, mesmo que seja pesado e nem sempre recompensado como deveria”, explica.
Para Jairo, o maior desafio atual da agricultura não está apenas nos custos ou no clima, mas na falta de valorização e sucessores. “Hoje ninguém mais quer saber de roça. Serviço braçal está cada vez mais escasso. O jovem não quer mais levantar cedo, sujar as mãos de terra. Quer um serviço leve, com celular na mão e ar-condicionado. Isso preocupa muito”, relata.
A crise silenciosa do leite
O setor leiteiro, em especial, tem sido um dos mais atingidos nos últimos anos. Oscilações no preço pago ao produtor, concorrência com leite importado e altos custos de produção colocam os pequenos agricultores em situação crítica. “A gente trabalha, investe em ração, cuidados, sanidade dos animais… mas quando vê, o litro do leite não paga nem o custo. E tu tem que continuar, porque parar não dá”, lamenta.
Entre o campo e a boleia
Jairo divide a vida com Eliani Orlikzek, sua companheira, que atua como caminhoneira na região de Ibirubá. Ambos representam duas das profissões mais desafiadoras do interior gaúcho: o colono e o motorista. “A gente se entende porque os dois têm vida puxada. Ela na estrada, eu no campo. Mas um dá força pro outro, e isso faz a diferença. Já pensei até em largar tudo e ir com ela nas viagens, mas o coração ainda puxa pra terra”, confessa.
Apesar das dificuldades, ele reconhece que o apoio mútuo é o que mantém o equilíbrio. “A Eliani tem uma força incrível, e a gente compartilha os mesmos valores: honestidade, trabalho e fé. Quando a família apoia, tudo fica menos pesado”.
Fé, tradição e resistência
A fé, aliás, é presença constante na vida de Jairo. “Tem dias que é difícil, que tu pensa em desistir. Mas aí tu lembra do que já passou, das lutas que venceu, e segue. A fé é o que nos sustenta”, afirma.
Mesmo diante das incertezas, ele defende que o papel do colono nunca foi tão essencial. “Sem o campo, a cidade não vive. O leite, os ovos, os legumes, tudo sai daqui. Só que isso parece que muita gente esquece. A agricultura familiar ainda é o que põe comida na mesa do brasileiro”.
E quando questionado sobre o futuro, a resposta vem com realismo, mas sem amargura: “Eu só espero que os governos olhem mais para o pequeno agricultor. A gente não quer luxo, só condições de seguir produzindo com dignidade. E que mais jovens se interessem em continuar o que a gente começou. Porque sem sucessor, essa história pode parar”.