
Hoje, Marcos vive em Pontal do Paraná, litoral paranaense. Trabalha na prefeitura, mantém vínculo com o futebol em escolinhas e campeonatos de veteranos 50 e 55 anos – onde, não raro, ainda arranca aplausos com gols de placa.
Filho de dona Jovelita e seu Nestor, criado no bairro Floresta, em Ibirubá, Marcos Tadeu Oliveira Mendes viu na bola um caminho possível. E apostou. De roupeiro e reserva de goleiro no Juventude de Ibirubá, virou artilheiro-relâmpago no Florestal, ganhou apelido de “Gaúcho” no Paraná, foi campeão em Portugal e chegou ao Flamengo em 1996, onde treinou ao lado de Romário e jogou no Maracanã.
A história foi contada com emoção e bom humor no quadro “Baú do Esporte”, da Rádio Cidade, numa entrevista que ativou a memória afetiva de torcedores da região e relembrou uma das trajetórias mais improváveis do futebol local.
“Nem chuteira eu tinha, me emprestavam. Aí sobrou uma ficha no Florestal e me inscreveram. Negócio bem doido”, contou Marcos, lembrando o início no futebol amador. Antes disso, foi engraxate, jornaleiro, picolezeiro e servente de pedreiro. O primeiro treino no Grêmio de Ibirubá aconteceu às escondidas: “Se falasse em casa ia dar briga, porque todo mundo era Juventude.”
A virada começou com sete gols em três jogos. O professor Vitalino Barzotto, o Grizzo, viu potencial no garoto da rua Estrela. “Se não fosse o Grizzo, eu não tinha saído de Ibirubá. Ele falou com meu pai, que disse: ‘A partir de hoje, a responsabilidade do meu filho é tua’”, recordou.
Aos 17 anos, foi para o Colorado, em Curitiba, onde enfrentou dificuldades técnicas e culturais. “Quem joga na várzea acha que é só correr. Lá tinha que dominar, tocar, se posicionar. Quase fui mandado embora várias vezes”, admitiu. A chance veio num amistoso contra o Coritiba: dois gols e promoção ao profissional.
Depois de livrar o time do rebaixamento, foi observado pelo Inter, treinou com Taffarel, mas sua impulsividade atrapalhou: “Se eu não jogava, perguntava por que eu tava ali. Isso fechou portas.”
Vieram passagens por clubes como Santo André, Portuguesa, Moto Clube, Remo, Criciúma, Coritiba e Paranavaí. No Tubarão, em Santa Catarina, quebrou a perna: “Seis parafusos e uma placa. Disseram que eu não jogaria mais. Voltei pra Ibirubá e depois fui pra Curitiba sem ter onde morar.”
Na casa da mãe de um colega do Paraná Clube, viveu três meses treinando e se reabilitando. Voltou por cima: em Irati, virou artilheiro, campeão da segunda divisão e ídolo local. “Passei sete anos indo e voltando. Ali eu era rei”, brincou.
A carreira internacional veio no Vitória de Setúbal, em Portugal. Em seis jogos, nove gols, mas uma lesão no posterior atrapalhou a sequência. “Briguei com médico e treinador pra jogar. Mesmo machucado, ajudei o time a subir pra primeira divisão”, contou. Atuou ainda por Portimonense, União da Madeira e Loulletano. Na Taça de Portugal, marcou contra o Benfica e comemorou sentado em cima da trave. “Pedi pra um amigo me dar impulso. Até hoje tenho essa foto.”
Em 1996, o capítulo mais emblemático: o Flamengo. “Ganhava 30 mil lá, vim ganhar 7 mil aqui. Era menos dinheiro, mas visibilidade. Flamengo é outra dimensão.” Jogou contra o Grêmio no Olímpico, treinou com Romário, Bebeto e Sávio.
Sobre Romário, guarda uma lembrança divertida: “Num treino, fizemos uma jogada linda, ele parou e perguntou: ‘Por que tu não tá jogando nesse time?’. Respondi: ‘Se eu não jogava quando tu não tava, imagina agora!’”.
Sem sequência no Rio, voltou à Europa, desta vez para a Ilha da Madeira, onde reencontrou estabilidade e jogou sob comando de Jorge Jesus, futuro campeão pelo próprio Flamengo.
Apesar dos altos e baixos, Marcos reconhece: “Se eu pudesse falar com a bola, pediria desculpa. Eu podia ter me dedicado muito mais. Era novo, sem orientação. Gastei demais com festa, churrasco, noite.”
Hoje, aos 55 anos, vive em Pontal do Paraná, trabalha na prefeitura, participa de escolinhas e campeonatos de veteranos. “Outro dia fiz um gol de peito, chapéu e chute no ângulo. A bola ainda me perdoa”, disse, sorrindo.
A mãe, dona Jovelita, agora com 86 anos, e a esposa Josiane, continuam sendo seus pilares. “Se não fosse a Josi, eu tinha me perdido mais ainda. Ela me colocou com os pés no chão.”
























