28 de Julho, 2025 09h07mESPECIAL COLONO E MOTORISTA por JORNALISTA CRISTIANO LOPES

Nos caminhos da vida: 50 anos sobre rodas com Élio Truss

Aos 82 anos, o caminhoneiro conta sua saga, desde os Ford 35 de 1964 até as estradas do Paraguai, celebrando a camaradagem que se perdeu no asfalto moderno.

 Aos 82 anos, o caminhoneiro conta sua saga, desde os Ford 35 de 1964 até as estradas do Paraguai, celebrando a camaradagem que se perdeu no asfalto moderno.

Com as mãos marcadas pelo volante e o olhar de quem já cruzou meio país, Élio Truss, 82 anos, relembra as estradas de cascalho, o ronco dos motores e os volantes “queixo duro” que o acompanharam por cinco décadas de profissão — um tributo poético à essência do caminhoneiro e à riqueza que carregam nas costas.
Em entrevista concedida no estúdio da Rádio Cidade, Élio Truss, com as mãos marcadas pela alavanca de marchas e o olhar de quem já cruzou meio país, apontou para o infinito da BR-386. “No meu tempo, não existia caminhão automático. Nem direção hidráulica.” A voz, firme como as engrenagens dos velhos Fiat e Ford 35 que o iniciaram, traduzia orgulho e saudade.
Em 1964, com apenas 21 anos, Élio aprendeu a guiar um Ford 35 de caixa seca. “Não tinha nada, tinha só vontade de pilotar”, diz, e os olhos brilham ao recordar as trocas de marcha “no ouvido” — sem conta-giros, o motorista confiava no ronco do motor para mudar de marcha. A embreagem pesada, o câmbio seco, o esforço físico para domar aquelas máquinas eram sinais de bravura e convicção.
Dois anos depois, em 1966, Élio “foi para o trecho” de verdade, entregando cargas pela região de Ibirubá e se aventurando rumo ao centro-oeste. “Andei muito, andei no Paraguai também. Levávamos a safra de soja até Paranaguá.” Em sua memória, desfilam estradas de terra batida, pontes estreitas e pausas obrigatórias para ajudar colegas em apuros. “Quando alguém tinha problema, a parceria parava. Não havia asfalto nem movimento intenso — a amizade era combustível.” O motorista recosta a cabeça no banco e retoma o tom mais grave. “Hoje é diferente. Se quebra, você chama guincho. Ninguém para mais. As pessoas têm medo dos golpes, dos assaltos. Entendo, mas dói.” O relato é um misto de compreensão e melancolia: a solidariedade que unia estradeiros se desfaz diante da insegurança moderna.
Apesar dos contratempos, Élio celebra as conquistas tecnológicas: direção hidráulica, embreagem a ar, câmbio com conta-giros. “Cada avanço tornou a vida mais leve, mas também menos intensa.” Para ele, os velhos caminhões tinham alma — e cada quilômetro era poesia em movimento.
Hoje, já aposentado, mas jamais distante das estradas, Élio visita os amigos nas paradas e compartilha histórias com a nova geração de motoristas em encontros semanais nos postos de Ibirubá. “Quero que eles conheçam de onde viemos. A estrada é escola de paciência e coragem.”
Com 50 anos de estrada cravados na memória, ele se levanta, ajeita o boné e volta ao presente: “Ser caminhoneiro é carregar a riqueza do nosso país e o nosso sonho. Se hoje as estradas mudaram, a paixão permanece.” E, ao partir, deixa para trás o eco de um motor antigo — lembrança viva de uma era em que o volante era também pincel de uma poesia rodoviarista.
 

Publicidade

Notícias relacionadas

No volante da vida: a dedicação de Nilton Martins, há 15 anos como taxista em Ibirubá

Com empatia, pontualidade e respeito, ele é símbolo de uma profissão muito antiga e ainda valorizada

28 de Julho, 2025

Aluno Repórter mergulha nos 70 anos da Escola Rincão Seco interior de Ibirubá

Projeto da Redação Integrada coloca estudantes do 9º ano como protagonistas no resgate da memória da escola e da comunidade rural

21 de Julho, 2025

Jornal O Alto Jacuí receberá homenagem solene da Câmara de Vereadores pelos seus 50 anos

Ao completar 50 anos, o Jornal O Alto Jacuí celebra não apenas a sua longevidade, mas a sua capacidade de se reinventar

26 de Maio, 2025